quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

ELE ESTÁ NO MEIO DE NÓS

Conversa ao jantar...

- Papá, Jesus está dentro do nosso coração?
("Eu sabia que esta conversa ia chegar um dia... Vou, cobardemente, fingir que não ouvi, pode ser que não volte a perguntar..." - pensei.)
Nova pergunta, diferente:
- Papá, o que é que faz o nosso coração bater?
- ... Eeeeeh... O que faz bater o nosso coração é... o cérebro.
- Aãh? O quê?
Era ver a expressão das duas, num misto de surpresa, confusão e desilusão. Continuo:
- Nós, aqui, dentro da nossa cabeça temos o cérebro que comanda tudo no nosso corpo. Por exemplo, é o cérebro que faz com que eu levante este braço, e agora o outro, com que respiremos e o coração bata, também, entre muitas outras coisas. Quase tudo.
- E então o que faz o nosso coração mexer?
- Mexer? Mexer como? - pergunto eu, disfarçando.
- Abanar!...
- Abanar?
Segue-se um breve silêncio.
- Jesus está dentro do nosso coração? Na escola disseram-me que estava aqui dentro...
- Não filha, o Jesus está no coração dos benfiquistas. No nosso está o Pedroto.
- Quem? O quê?
- Sim, o Pedroto. Aliás, se olhares com atenção para o peito, ainda se consegue ver a haste dos óculos, que aquilo ainda era grosso. E eu também guardei aqui um espacinho para o Mourinho e para o Bobby Robson. Sabias que eles se amantizaram? Foi assim que tudo começou para o Mourinho... Pelo menos era o que se dizia na altura e sabes que, nestas coisas, não há fumo sem fogo. Mas não foi caso único, passou-se o mesmo com o Vítor Baía e o César Peixoto.

Claro que isto era o que eu gostaria de ter respondido num universo paralelo. O que eu realmente disse foi:
- Não sei, filha, mas olha que isso da devoção a Jesus é um bocado antiquado. Equivale a pedires-me um Commodore Amiga para o Natal. O que está a bombar agora é o Maomé!... Literalmente.

Ok, também não foi isto... Recomecemos, com a seriedade possível.

- Papá, Jesus está dentro do nosso coração?
- Eeh... Ummhh... Eeh... Ele não está mesmo dentro do coração... o importante é se tu achas que está, se acreditas nisso, se queres que esteja...
- Mas tu achas que está?
- Eu acho que não está, mas não importa o que eu acho, importa o que tu queres. Tu queres que esteja?
- Sim, quero.
- Então ele está.
- Como é que sabes?
- ...Eeeehh... Sei porque Jesus está se tu quiseres que ele esteja...
Após olhar de desconfiança, rasteira-me com nova pergunta:
- E então está no meu e não está no teu?
....(E agora, como saio desta?)
- Se estiver no teu, também está no meu, está no de toda a gente.

Provavelmente acabou a conversa mais confusa do que começou, mas, pelo menos, penso que consegui preservar o mais importante: Liberdade de escolha, sem condicionalismos.